Textos

O ENSANDECER DOS PÁSSAROS - PARA PESSOAS ESPECIAIS
O ENSANDECER DOS PÁSSAROS
Marília L. Paixão

Definitivamente, escrevo melhor pela manhã. Exceto em manhãs como esta. Estava ainda bastante sonolenta na cama e com aquela pequena sensação que alguma coisa me apertava. Seria o pijama? Será que minha consciência pesada de bolo e doce de leite tinha me acordado mais gorda?! Eu que raramente como doce de leite por reservar a vaga de engorda sem restrição para os chocolates da vida. Com aquele despertar a manhã seria horrorosa. Melhor tentar dormir mais um pouco e acordar me sentindo magra. Pensei. Quem sabe o sonho afastará os fantasmas do meu cérebro.

Breve descobri que um sonho não aconteceria, pois os passarinhos estavam exageradamente eufóricos. Com tamanha estranheleza de pios em meu subconsciente eles pareciam estar me gritando sem cessar. Mesmo se estivesse sonhando não poderia ignorá-los e pulei quase cambaleando da cama. Como me senti impressionada abri logo a janela da sala de estudos que dá para o terreiro.
Foi à conta de ver algo bem colorido no final de um pulo distante. Tão distante que meus olhos não entendiam direito. De qualquer forma deixei meu coração gritar com toda força:

- Daggerrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr!!!
Meu grito deve ter alcançado a coisinha colorida que se deixou caída lá longe no chão.
Os passarinhos tinham parado de piar. E até meu pijama tinha parado de ficar apertado no peito. Agora eu sentia meu coração pulsando como o de um ser humano fora do sonho. Eu estava absolutamente acordada e emocionada. Queria era entender tudo aquilo. Deixei que ele se aproximasse sem precisar gritar de novo e ele veio sem as coisinhas coloridas. Talvez para voltar mais rápido... Como iria saber?! Não sabia como lhe dirigir umas primeiras palavras e ao mesmo tempo esconder minha emoção. Parecia que minha mãe estava dentro de mim e tossi umas palavras querendo explicação.

- O que estava acontecendo aqui?! Por que os pássaros estavam desesperados?! Por onde andava você sem notícias este tempo todo? Quem lhe deu permissão para sumir assim?!
- Ninguém!

- E você acha que basta dizer "ninguém" e está tudo explicado?! Você acha que pode viver assim sem limites?! Some a hora que quer e aparece na hora que quer?!
- Não estou aparecendo. Eu estava desaparecendo. Foi você quem me gritou.
- ah! Desaparecendo?! Mas você já estava desaparecido!
- Estava perdido.
- E agora aparece e desaparece de novo pelas minhas costas?! Bela cria eu pus no mundo! Pode me dizer o que fiz para merecer isso?!
- Você não precisa mais de mim!
- Ensapolouqueceu?! De onde tirou isso?!
- De Olinda.
- Você sapoenlouqueceu em Olinda?! É isso?!
- Um tubarão me mordeu em Olinda. Deve ser isto!
- Você está com ciúmes do tubarão Dagger?!
- Não. Apenas morto por ele.

- Certo. E o morto sapo ensapolouquecido ia fugindo levando uma trouxinha colorida enquanto eu inocentemente dormia?!
- Sim. Você disse que não devemos fazer as pessoas sentirem pena da gente.
- Eu não teria pena de você. É só amor o que lhe tenho.
- O tubarão tomou seu amor.
- Pirou de vez, mesmo!
   Mas que cores são aquelas que você ia levando?!
- São as bandeiras!
- Você ia me abandonar e ainda ia levar minhas bandeiras?!
- Elas também são minhas.
- Ta! Da próxima vez que você sapoenlouquecer e achar que as bandeiras são posses de direito seu, faça o favor de me levar junto que eu também te pertenço.
Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 28/10/2008
Alterado em 28/10/2008
Copyright © 2008. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.


Comentários


Imagem de cabeçalho: inoc/flickr