SE EU TINHA FICADO OU NÃO COM ELE
SE EU TINHA FICADO OU NÃO COM ELE.
Marília L. Paixão
Quando o sutiã começa a apertar é sinal que tem mulher engordando. Eu bem que poderia ter um coração mais vegetariano ao invés de gostar de carne como um leão. Se pelo menos eu pensasse em peixes no lugar de um só boizinho... Se pelo menos este pensamento existisse uma vez por mês que fosse. Com certeza não falharia tanto a minha memória e eu envelheceria menos rápido.
Numa ocasião em que fazia boas caminhadas com um colega de trabalho que por sua vez me reparava muito, mesmo a gente tendo deixado claro que o programa das caminhadas não tinha nada a ver com namoro ou colorida amizade, nossos papos ficaram cada vez mais descontraídos e ele se sentia a vontade para falar dos defeitos físicos dos seres humanos inclusive dos nossos.
Foi ai que ouvi pela primeira vez de um homem que os meus lábios eram muito finos e não sei mais o quê. Depois falou que minha agitação deveria ser por causa do excesso de carne bovina. Ele tinha uma forma legal de falar. Disse bem assim: Eu também ficava muito nervoso quando comia muita carne vermelha. Ficava irritado fácil, foi o médico que me alertou. Cortei a carne vermelha e me senti outro homem. Sabia que a carne vermelha também envelhece a gente bem mais rápido?! – Não! Não sabia! E não sabia mesmo.
Naquela época eu nem ficava reparando linhas do tempo no espelho. Estava sozinha recentemente e tinha completado 38 anos naqueles dias. Quando somos amados pensamos que tudo na gente está bem. Numa das caminhadas eu levei a máquina. Disse assim: Tire umas fotos minhas para guardar destes 38 anos. Ele tirou várias, mas não conseguiu me fazer sorrir direito. Imaginem que a maioria não prestou para nada. Na verdade eu queria mais eram umas fotos com o meu carro novo. Para não ser muito injusta umas três fotos das que ele bateu ficaram boas. Não era minha época de máquina digital ainda.
Foi um mês de muitas caminhadas e várias partidas de baralho. Gosto de jogar buraco. Jogávamos com uma outra professora quase aposentada ou já aposentada de um dos cargos, que era amiga dele. Cheguei a pensar com meus botões se eles já tinham tido algum caso. Arrumei mais uma amiga e passamos a jogar com mais freqüência. O cara era bom de papo. Dos que falam coisas interessantes sem cansar e nos deixa também falar. Era calmo com a fala e era um cavalheiro. Sabia que eu estava em um momento difícil de fim de relacionamento e respeitava minha não disponibilidade para tocar no assunto.
Ele deve estar solteiro até hoje se é que não engravidou nenhuma menininha. Não era do tipo que pensava em casamento, mas casar e fazer filhinhos são duas coisas bem distintas! Eu sei que nós nunca fizemos nada. Pode até ter passado pela cabeça dele, mas na minha bastavam as caminhadas. Nunca iria querer ser mais uma nas historinhas dele. E sem falar que qualquer historinha com ele iria me fazer sentir um frango entre um peixe e um boi. Não ia passar de uma historinha de sexo bobo à toa. Definitivamente não tinha mais idade para isso.
Gostava de ouvir as historias que ele contava com as meninas da cidade. Eu nunca gostei de ser uma historinha na vida de ninguém. Gosto das grandes histórias. Depois eu era acostumada a eu mesma fazer as minhas. Também! Para que tantas longas histórias? Conto com algumas boas, muito boas! Nem mais careço de nenhuma outra longa história de amor. Para tudo há seu tempo e o meu foi bem aproveitado. Posso continuar como estou até o dia do caixãozinho e está bom demais!
Deus é lindo! Aqui em casa graças a Deus há frango, passarinho, boi, lagartixazinhas de parede e sapinho. Para falar a verdade há até um formigueiro. Mas falta peixe e água. E assim descobri a causa do meu envelhecimento. O excesso de carne vermelha e a falta de água. Tomo a água do café e dos refrigerantes. Diminuo os refrigerantes e aumento os cafés. Isso é que é envelhecer com consciência de hábitos tão errados e repetitivos. Eu sou uma das que não sabem matar a sede. Vivo arrumando um jeito de correr dela. Talvez eu tenha sido peixe em outra vida e talvez viesse parar nesta já enfartada de água.
Me desculpo assim e tomara que o Fábio Daflon não leia esta crônica. Tomara! Com certeza ele adivinhará as possíveis doenças que me esperam na terceira idade. Será que eu quero saber?! Apago este texto ou tomo um copo de água? Eu sei que nada me preocupa mais que este sutiã quando aperta. Nada incomoda a uma mulher mais do que ela pensar que está engordando. Por isso que esta história da Capitu faz tempo que já me cansou. Imagina na época destas caminhadas com o colega professor quantos não ficaram pensando se eu tinha ficado ou não com ele.
Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 11/12/2008
Alterado em 11/12/2008
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