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NÃO SABER O FIM DE NADA OU DE TUDO
NÃO SABER O FIM DE NADA OU DE TUDO


Ele passa em frente a porta volta e enfia a chave. Ela não entra. Ele caminha até o carro e procura pela chave certa, não sabe se acerta, mas volta e tenta sem se desligar do desconforto de estar bêbado ou ter sofrido dores de solidão e desapego. Encosta no capô do carro e retorna o vulto da mulher que se atirara pela estrada. Depois o ranger dos pneus, os gritos enfurecidos com a própria sobrevivência e ele era o vilão. Fugia a louca enquanto ele não conseguia se recuperar do susto. Metade do carro morto, destruido e ele vivo.

- Pai me leva. Eu não posso perder este show! -Sua mãe já disse não. Suas notas não estão nem boas. Ela tem razão! Pai...mãe sempre arruma uma desculpa para que eu não ir ao Rio...Se as notas fossem boas a desculpa seria outra...O senhor está indo mesmo...não vai nem precisar sair do seu caminho, pai. O Zuca me pega depois do viaduto, me leva, pai!

Fique você sabendo que Renata vai lhe beijar os pés para convencê-lo a levá-la para o Rio, mas ela não pode ir. Não pode ir Não se esqueça! Já disse que não e ela está conformada, não deixe que ela lhe dobre, não caia na conversa dela. Estou indo trabalhar e quando voltar quero encontrá-la aqui, está me ouvindo?! Sim! Ele estava ouvindo.

O médico impassível comunicou a morte. Ela não podia ter ido..Eu sabia que ela não podia ter ido...Sua mulher não sabia dizer outra coisa...precisaria interná-la ou pelo menos poderia ter morrido no lugar dela. – Ela não podia ter ido..Ela repetia sem parar... Para consolá-la ele dizia: - Não consegui evitar.

Mas ele estava vivo diante a casa que nunca mais seria a mesma sem a filha e a esposa. Teria que acreditar que ela não sobreviveria em seu acidente no mesmo dia, na mesma estrada...Talvez sua curta vida estava com o dia marcado e a louca que surgira na estrada viveria  muito tempo. Não saber da chave era não saber do fim de nada ou de tudo que o afligiria dali em diante. O filho do vizinho levara a filha para sempre em sua moto possante.







Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 20/10/2009
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