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O SEGREDO DAS PALHAS - (BVIW)
Gostava de ficar ali olhando o muro. Era um muro quase inútil em termos de peso e proteção, mas muito útil em termos de respeito, pois ninguém o pulava. Para falar a verdade ninguém sequer movia uma palha para tentar enxergar lá dentro. Por trás do muro diziam que havia o caminho das almas mal comportadas. Umas cantavam e choravam, outras berravam e sangravam.

Seu Josias bem contava histórias que afastavam todos os curiosos do muro de palha, a começar por sua própria mão sempre fria que ele estendia dando as boas vindas. Criancinhas diziam que eram feitas de gelo e arrregalavam seus olhinhos fitando os dele parados. As mães temiam pelas crianças andarilhas e mantiam as suas longe do velhinho com fama de senhor das palhas. Suspeitavam elas que ele nem pertencia ao mundo dos vivos.

Lá no terreiro havia colchas mal costuradas e com falhas, contavam os passarinhos. Lençóis sempre manchados e sem brilhos. Nunca viam quem os estendiam ou quem os lavavam e porque eles sujavam tanto. O Sr. Josias, o principal suspeito de freqüentar a casa sem passar pelo muro de palha, também nunca fora visto fazendo a travessia.

Os passarinhos voavam para longe quando se assustavam com frases  nos lençóis. O vento gemia enquanto cantavam as almas boas. O muro de palha não se movia e nem se deixava abalar. Erguido por alguma força, protegiam almas que sangravam. Onde o sangue escorria era um segredo entre palhas. As almas cantavam: Go away. E o velhinho traduzia para as criancinhas: Vão embora. E elas iam. Só as palhas do muro ficavam e se impunham firmes sem medo de nada.

Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 01/12/2010
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