PROCUROU O QUE FAZIA TEMPO NÃO VIA
PROCUROU O QUE FAZIA TEMPO NÃO VIA
Marília L. Paixão
Maria Tereza vivia sua vida semi calada, semi aturdida. Durante sua mocidade tinha até um belo sorriso na carteira de identidade e não podia reclamar dos rapazes que a cortejavam. Ficava sempre em dúvida entre um e outro e acabava por sair com o mais persistente. Não tinha pressa em seus namoros. Gostava de caminhadas ao livre e deixava o escurinho do cinema para quando se sentia mais confortável com seu pretendente. Das moças mal faladas ela nunca seria uma. Era chamada pelas colegas até de “a mais certinha”. Veio o dia em que se casou. Por muito tempo não achou que tinha se casado errado. Decidiu até largar do emprego a pedido do marido. Não ganhava mesmo muito e ele lhe dizia que tudo que aquele dinheiro dela comprasse ele lhe daria. Arranjou-lhe logo um cartão de crédito! Não foram logo tendo filhos. Não! Maria Tereza por muitas vezes parava e pensava bem. Mesmo sem trabalhar fora, seu tempo passava tão rápido que ao se imaginar com novas ocupações com as crianças, se perguntava como seria o seu tempo. Além da casa sempre limpinha, tinha seus cuidados com ela mesma e mais os cuidados com as coisas do José João. Ele também era muito vaidoso. A barbearia em que ele assiduamente ia era perto do seu salão de beleza. Seu corte de cabelo era padrão e era mesmo muito bonito o seu José João. Suas camisas ela passava impecavelmente. Ele não era de lhe importunar cobrando por um filho, mas não deixava de comentar vez ou outra. Chegou o dia em que o filho veio. Era uma filha! Ele lhe escolheu o nome Rosa e ela decidiu-se por Rosalina. Até que João estava se saindo um bom pai. Levava Rosalina para pescar, para caçar e até lhe assistir jogar futebol. Tinha uns lugares que ele não levava Rosalina e nem ela. Aos poucos vou se dando conta que ela não era levada a lugar nenhum. E onde ia Maria Tereza? Maria Tereza só ia ao supermercado, na padaria, e no centro comprar roupas para a menina. Até suas idas ao salão de beleza tinha diminuído. As mãos faziam semana sim, semana não e o cabelo era só quando passava da hora de cortar. Maria Tereza gostava de ler. Era um hábito antigo. João quando queria ser carinhoso a chamava de esposinha inteligente. E depois de Rosalina raramente lia. A verdade é que cuidar da casa, da filha e das coisas do José João não era tão simples. Não era não! João também dizia que Rosalina lhe roubava muito tempo e que a vida tinha mudado até depois da vinda daquela preciosidade. A verdade era que João passava cada vez menos tempo em casa e quando vinha saia com Rosalina para que ela pudesse ter sossego para fazer outras tarefas. A vida de Maria Teresa estava passando pela fresta. Resolveu na volta de uma ida ao supermercado comprar uma revista. A capa trazia a foto de um dos seus ídolos da adolescência. Já não tinha tempo para livros, mas para folhear uma revista, não é possível que não arrumaria um tempinho. Seu ídolo já estava por volta do terceiro casamento e o assunto era o divórcio. Tinha foto das outras ex...
E uma delas estava com um corpo tão infeliz... Maria Tereza correu para o espelho para saber se também não tinha engordado. Ufa!!! Não. Também uma coisa que nunca mudou foi seu hábito alimentar. Nunca fora de comer até se fartar. À medida que foi lendo mais novidades na revista deu-se conta do tanto que estava desatualizada. Lembrou-se que a TV agora era a diversão da filha. Seus canais de preferência já não existiam. Sequer seguia alguma novela. E o jornal nacional? Nem isso!
Ouvia uma ou outra péssima notícia pela vizinha e José João cada vez menos ouvia. Estaria ficando feia e desinteressante? Foi ao guarda-roupa e nem sabia a data da última roupa que chamaria de a mais nova. Todas pareciam velhas. Eram roupas de quem não vai a lugar nenhum. Em estado de choque Maria Tereza pensou que não estava vivendo. Ela apenas estava se movendo. Mas quando é que ela se movia para ela? Não! Os movimentos não eram para ela. Todos os seus movimentos eram para eles. Não era ela a esposinha inteligente? Que Maria Tereza era aquela? Iria ao shopping!
Correu até a máquina de lavar e a desligou. Banhou-se rapidamente e vestiu uma das suas roupinhas simples. Procurou na gaveta o cartão de crédito que fazia tempo não via. Não encontrou.
Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 03/09/2007
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