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SEM JANELAS, SEM VIDA



A Sra. Santos, era viúva a uns anos; alegre, falante e cheia de iniciativa. Tinha uma saúde que lhe permitia dirigir seu carrinho até chegado os 80 anos. Vivia sossegada em área nobre, mas de modo simples. Aconteceu que uma filha fora abandonada pelo marido e caiu em dificuldades. Sra.Santos vendeu o carro. Mudou-se para um aluguel mais barato em prol da filha. A família arrumou uma solução para que ela continuasse a ajudar com sua pensão: Uma filha bem de vida construiu uma casa grande para três moradas. Uma para ela, outra para o filho e uma do ladinho para Dona Santa. Do lado de fora a residência parecia uma só: Moderna, bonita e segura. A boa mãe não mais pagaria aluguel e o que pagava do aluguel e condomínio iria para ajudar pagar escola para a filha.

Depois da mudança, Santinha não era mais a mesma. Socorrida a filha, faltava quem socorresse a senhorinha. A morada que lhe fizeram tinha uma janela só junto a porta única e principal. Essa porta dava para a mini sala que em continuidade dava para um mini quarto, em continuidade dava para uma cozinha compridinha, que dava para um minúsculo banheiro. Minúsculo mesmo! A impressão que se tinha era que a casa dela era um beco cumprido, que me fazia lembrar a música do barracão de zinco. Para piorar nos contou a senhorinha que ela tinha caído no banheiro e ficara imprensada entre o vaso e a parede por horas sem ninguém para lhe socorrer. Deus mesmo lhe dera forças para conseguir se arrastar dali. Até hoje está em tratamento fisioterápico e sequelas no fundo da alma. Ao fitar o banheiro, achei que caída ela não caberia ali...

Ela continua falante e nos contou que falecerá ao completar 88 anos, que foi a idade em que o marido morreu. Ela acha que merecia um final de vida em uma morada melhor, mas não há mais o que fazer. – Quantos anos a senhora tem agora, Dona Santinha? – oitenta e cinco, minha filha.



 
Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 05/05/2019
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