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ENTROU SETEMBRO PELO RALO

Não me molha a chuva lá fora, somente a dor de dentro. Uma dor que sei de onde veio, mas não sei quando vai... Me volto para a água fina que cai. Me apegar a ela parece mais correto que a própria entranha. Afinal, até a flor de madeira jaz em um canto da minha escrivaninha. Tirasse uma foto e ela estremeceria. De frio? De nada entender? De estar ali como um jornal velho a espera do vidro para ser enrolado antes de ir para a lixeira? Setembro não devia começar assim. Setembro devia começar como começam as moças que dançam pela avenida.

Quem sabe poderia reiniciá-lo se me fosse devolvido o final de agosto. Teria dois dias para configurar a nova estação. Teria um botão especial de deletagem, sem fios, sem ramais, sem grampos ou grampeadores. Sem eletricistas, sem disjuntores. Sem câmaras, sem ardores. Veja só, até poeta viraria. Poeta fabricando farinha.

Volto para a janela sem chuva, sem bolinhos de areia e cimento. Que eu preciso encarar a vida sem procurar beleza nela todo dia. Deixar que a beleza se escorra naturalmente como as pedrinhas que caíram no ralo do terreiro.
Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 01/09/2019
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