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TRAGÉDIAS DA PELE
TRAGÉDIAS DA PELE
Marília L. Paixão

Quase todo dia é dia em que há um querendo morrer. Uns talvez só de raiva, outros de sede, outros de fome. Mas a vida prossegue mais pela sede de viver que a tudo justifica. São inúmeros os motivos para a vida vencer a raiva, a sede e a fome. A morte se sorri não se sabe de onde e vai embora sem levar raiva de ninguém. Ainda assim há os que acabam morrendo sem querer por um motivo ou outro e a mídia nos deixa sabendo de tudo. Parece que se trata da tragédia dos outros quando a fala não é a do nosso cotidiano. Mas será que precisa ser? Teria que ter acontecido com o vizinho, irmão ou amigo para a tragédia parecer também nossa?
Quando estaremos seguros de que nunca nada tão triste e inesperado não ocorrerá em nosso telhado? Bom não esperar acontecer para pensar. Afinal, pode até acontecer nesta tarde ou Deus nos livre de acontecer nesta noite. Deus que nos livre sempre. Para isso, Deus não pode ser um delírio ou nossas mais belas esperanças de proteção terão sofrido exílio. Compartilhamos com os norte-americanos essa consistência da fé, este otimismo em um Deus verdadeiro que sempre nos cumprimenta e guarda. Possuímos este Deus que nos abençoa. Que coisa boa!
Hoje estava pensando nos jovens dessa era da informação veloz. Em que pensam esses jovens banhados por milhões de pensamentos. Tanta informação ao alcance das mãos. Tantas idéias expostas prontas para serem escolhidas ao gosto ou pelo puro acaso de um click, de um toque no mouse, de uma nova página... Há os que não escolhem nenhuma. Há os que se deixam absorver pela influência do próximo. Aquela velha história do grupo, da influência do meio. Tenho temores a respeito do tipo de informação que os jovens abraçam... Cada vez parece menor a influência dos pais...
Toda vez que penso em influência do meio me lembro do livro “O Cortiço” de Aluisio Azevedo. Um outro livro que me fez lembrar este foi “A Distância Entre Nós” da escritora e jornalista Thrity Umrigar que de forma maravilhosa faz um paralelo até poético entre pessoas tão distantes vivendo num mesmo mundo. Com que beleza a diferença de classes é descrita neste romance. Com que riqueza ela nos presenteia com um pouco da cultura indiana. E assim vão sendo discutidos os anseios de todos os povos falando apenas de dois seres.
Tudo é puro, tudo é cru. A distância e a presença. A pele, a nossa pele e o trato que damos ou não damos a ela. Nós somos seres de mãos bem tratadas e somos seres de mãos rachadas. Somos um sabão ao sol que se racha lá esquecido. O ser de dentro da pele sente tudo igual. A dor não é diferente em nada quando a ferida é a mesma. Quando se trata do que ascende ou murcha em uma alma, não há distância sequer entre os saberes. Não há diferença nenhuma. Será que precisamos sentir tragédias na pele para entendermos disto?
Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 17/10/2007
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