O dia era branco, mas Dionísio não sabia o que seria dos outros. Pessoas sussurravam pelas calçadas, mas, de moto, outras gritavam. Seu bairro estava infestado de manifestantes e ele devia mesmo se manter calado. O que será, o que será que não tardaria a acontecer?
Temia pelos amigos. Filipa, sua ex namorada, tinha parado de pixar muros. Fez bem! Agora era bom evitar até versos e trovas. Estava cansado de ver bandidos falando de decência e censura como se por trás dessas ideias existisse um mundo perfeito. Em sua cabeça tamborilava a música do Chico:
O que será que será
Que todos os avisos não vão evitar
Porque todos os risos vão desafiar
Porque todos os sinos irão replicar
E todos os meninos vão desembestar...
Dionísio não sabia o que seria, Tereza não sabia o que seria, Vó do Carmo tinha calafrios. Pensar que uma casa sem armas é que era o desafio. O que seria deste mundo desvalido?
- A única certeza é a do caos.
Dionísio pensou, mas não falou. Não demora e as pessoas vão perder a fala, vão perder o bonde. De direito preservado sobrará o do silêncio ou da fome.
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Trecho da canção de Chico Buarque