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UM "OI" LITERALMENTE GAY
UM “OI” LITERALMENTE GAY
Marília L. Paixão

Hoje parece um bom dia para escrever sobre o adeus. Um pouco nostálgica coloco a culpa na forma rápida que me despedi da minha mãe e irmão sem nem tempo de sentar e tomar o café com eles. Tinha acordado já com vontade de ir embora, mas não tinha dito nada para eles que ainda estavam dormindo. Corri na rodoviária e a volta foi só para pegar as coisas. Ontem, ao ligar para minha mãe, ela disse que tinha até chorado por não ter se despedido direito. Mas naquela manhã, por estar meio assim sem saber como dentro do ônibus, resolvi que  não me faria bem escrever sobre o adeus. Escreveria sobre o oi.

Afinal, há um “oi” vivo e um “oi” morto. Há muito mais que dois tipos de formas de se dizer oi. Os piores são os sem graça. São piores até que os que são falsos. De um oi falso você sabe que não precisa esperar nada de bom dele. De um sem graça você não sabe o que esperar e nem onde vai dar. Muitos já deram romances.

Vou falar de um oi de duas meninas. Duas moças! Quem for homofóbico, melhor não ler mais que até aqui. Rs... Tenho que me lembrar que existem pessoas tristes e estas são tristes de inúmeras formas e quem sofre de homofobia sofre da pior delas. Eu não conseguiria medir o tamanho dessa tristeza, seja pelo ângulo espiritual ou intelectual. Quem sofre deste mal deve sofrer também de uma raiva imensa por ser um ser assim tão triste por dentro e por fora do coração.

Lá da minha poltrona vi a moça chegando. Já entrou no ônibus toda alegre procurando alguém. Foi logo dizendo oi como se o sol fosse começar naquele instante. A outra moça respondeu um oi sem graça ao mesmo tempo em que recebia um beijo na boca. Parecia que ela queria olhar para os lados antes como se estivesse preocupada com algum espectador. Seus olhos se encontraram com os meus, mas já era tarde. Eu já tinha filmado tudo. Para ela eu tinha acabado de ver o que não devia.

Minha vontade era de dizer a ela que podia ficar despreocupada. Não iria colocar em nenhum jornal e nem fazer propaganda contra novos namoros em nenhum programa de TV. Continuei ali me sentindo no lugar errado num momento certo, pois aquele tinha sido o oi sem graça mais bonito que presenciei nos últimos tempos.

Poderia escrever sobre a sensação de medo que vi no olhar da moça. Poderia escrever sobre meu desconforto em estar tirando a liberdade da moça em aceitar o beijo. Melhor seria se as pessoas pudessem se beijar sem se preocuparem tanto. Eu nem teria maliciado sobre o beijo se não fosse o olhar meio desesperado dela. Queria mesmo é que ela soubesse que erradas são as pessoas que se incomodam tanto com a liberdade e felicidade dos outros.


Marília L Paixão
Enviado por Marília L Paixão em 27/01/2008
Alterado em 27/01/2008
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